Em didático voto, no procedimento PPE 769, o Min. Celso de Mello manteve a prisão cautelar para fins de extradição de cidadão chinês e, em conformidade com outros julgados, ratificou a tese da aplicação dos tratados de extradição a fatos ocorridos antes de sua celebração.
Embora haja previsão na Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados acerca da irretroatividade, havendo convenção no próprio tratado bilateral de extradição, sua aplicação pode, perfeitamente, retroagir. Ademais, independente da existência de um tratado de extradição, este procedimento pode prosseguir no Brasil fundamentado em declarações de reciprocidade.
Segue, abaixo, notícia publicada, na segunda-feira, dia 22 de fevereiro de 2016, no site do Supremo Tribunal Federal sobre a decisão no Pedido de Revogação de Prisão Preventiva de Extradição nr. 769/STF.
O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), manteve a prisão cautelar para fins de extradição do cidadão chinês Wanpu Jiang, investigado em seu país pela suposta participação em um golpe financeiro que lesou mais de duas centenas de pessoas. Na decisão, proferida na Prisão Preventiva para Extradição (PPE) 769, o ministro rejeitou argumento apresentado pela defesa, segundo o qual o tratado de extradição entre Brasil e China, promulgado no Decreto 8.431, de 9 abril de 2015, não poderia ser aplicado a crimes praticados antes de sua vigência.
Segundo o entendimento adotado pelo decano do STF, a Corte admite a possibilidade de o tratado internacional aplicar-se a fatos criminosos ocorridos anteriormente à sua celebração. Isso porque tais convenções internacionais não tipificam crimes nem estabelecem penas. “As normas extradicionais, legais ou convencionais, não constituem lei penal, não incidindo, em consequência, a vedação constitucional de aplicação a fato anterior da legislação penal menos favorável”, destacou o ministro ao citar precedente específico na matéria.
O relator explicou, com apoio em magistério doutrinário, que a questão também é objeto da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, formalmente incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto 7.030/2009, que condiciona a aplicação retroativa dos tratados internacionais ao comum acordo entre os Estados celebrantes. No caso em questão, destacou que o Tratado de Extradição Brasil/China prevê expressamente essa possibilidade.
Ainda segundo o ministro, mesmo que não fosse possível conferir eficácia retroativa a tratado de extradição, tal circunstância não impediria a formulação do pedido, “pois este pode apoiar-se em outro fundamento jurídico, a promessa de reciprocidade, que constitui fonte formal do direito extradicional”.
Outras alegações
O ministro também rejeitou outros argumentos apresentados pela defesa, como o fato de inexistir condenação contra o extraditando em seu país de origem, e o fato de ele ser casado com brasileira. No caso do casamento ou união estável, o STF já possui entendimento consolidado na Súmula 421, no sentido de que não se trata de obstáculo à extradição. E no caso da ausência de condenação criminal, também é admitida a extradição com base em investigação policial ou em processo judicial em curso, desde que haja ordem de prisão expedida por autoridade estrangeira competente.
“Não tem qualquer relevo jurídico o fato de inexistir, no momento, ‘sentença condenatória’ contra o extraditando, pois, como se sabe, o ordenamento positivo brasileiro e o tratado bilateral de extradição Brasil/China expressamente reconhecem a possibilidade de formulação de pedido extradicional de caráter meramente instrutório”, afirma o relator.
Outro ponto abordado pela defesa foi a alegação de que os atos praticados não cumprem o critério da dupla tipicidade – ou seja, não encontram paralelo na legislação penal brasileira. Para o ministro, os atos praticados encontram correspondência na legislação brasileira como crime contra o sistema financeiro (artigo 16 da Lei 7.492/1986) e, até mesmo, estelionato (artigo 171 do Código Penal).
FONTE: Site STF